Os caça-portuguesinhos
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Neste grande eremónimo, persignado Portugal, repetitório seja seu nome, para avezar as orelhas de seu povo, galeote do ascenso, de que fracas gentes fazem fortes reis… na barriga. “Um país que vale por mil”! Porciúncula da Europa, prosopopeia de faraónica panóplia de sucessos muitíssimos. Donde, as/os fluffers [1] do patriotismo, os psilos da ziguezagueante autoestima, sejam ofício de arte e vejam e promovam português a pontapé [2]. O festival da Eurovisão é o tablado dessa patrioteira dileção. Na edição de 2010 [3], Sérgio Mateus, vertedor da RTP de palavras sobre as imagens, alvoroçava-se aquando das panorâmicas das câmaras sobre a jubilosa assistência: “como podemos ver ali bandeirinhas de Portugal”, “olha ali bandeiras de Portugal”, “e ali estão mais umas bandeirinhas de Portugal”; na 1ª fase da semifinal o representante grego passa à final, chibata Mateus o céu-da-boca: “pelo menos já temos metade de um português na final. Este senhor Giorgos que é filho de uma portuguesa. A mãe é portuguesa, nasceu na Madeira”. E, quando Filipa Azevedo é escolhida, ele sobreaquece-se: “Portugal! É o quinto ‘tá ali Portugal! Obrigado! Obrigado! A todos aqueles que votaram na nossa canção. Estamos na final! Estamos na final!”. Perigual, os membros do Governo andam de déu em déu de mão estendida à verde-rubefação [4].
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[1] Importante profissão na produção de filmes porno que zela, nas pausas das filmagens, pela prontidão para a performance, do principal instrumento de interpretação dos actores.
[2] Lugares de filmagem de “Ghostbusters” (1984). Os caça-portugueses estacionam-se à borda mar, José Sócrates situa: “eu conheço os portos portugueses. Sempre adorei portos. Gosto da atmosfera dos portos. Gosto de visitar portos, porque os portos são para mim sempre e sempre foram uma inspiração para a aventura”.
[3] O ano de Safura com a canção “Drip Drop”, cantora, licenciada em música, leitora da série “Twilight”, vencedora do Ídolos, toca violino mas prefere o saxofone, representante do Azerbeijão. País que gratificou o nosso Durão Barroso com honoris causa pela universidade de Baku. E de Sofia Nizharadze com “Shine”, cantora, compositora e atiz da Geórgia. Também licenciada em música, nos palcos desde os 3 anos, participou em musicais em Paris, e cantou duetos com José Carreras, Chris De Bourg ou Andrea Bocelli.
[4] Por que José Mourinho: “sou grande mas não quero ser especial”, ao receber o prémio de treinador special do marketing da indústria do futebol, disse: “boa noite, peço desculpa por falar em português, mas sou um orgulhoso português”, o fluffer Laurentino Dias, secretário de Estado do Desporto, esticou: “e ele que teve, para nós, a honra de se dizer orgulhosamente português nesta cerimónia. Fiquei também muito feliz por isso, por ele querer realçar essa qualidade de português e dar com isso a todos nós, portugueses, uma enorme alegria. Acho que devo também uma palavra ao Cristiano Ronaldo que esteve uma vez mais entre os melhores do mundo. E já agora, se me permite, uma palavra ao Pedro Pinto, o vosso colega da comunicação social, que está a apresentar esta gala e que significa para nós, que a diversos níveis, Portugal estava representado no podium. Estava representado no palco na gala da FIFA, o que contribui de certa forma, para nos fazer perceber que nós temos condições, capacidades, argumentos, para estar ao nível dos melhores em qualquer circunstância”.
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O orgulho [1], como o privado arbusto das senhoras [2], deve ser podado com imaginação, e, o nacional é bom [3]. Detrás de cada porta verde-rubra está um português, não há invento ou batizado, sem a mão que embala o berço afonsino, como reportado pelo Tom Selleck [4]: portagens Linha Verde ou despachar faxes da praia. Portugal é uma marca vendável, sem ossos, por qualquer celebridade [5], até nos mercados do Butão nos comem [6]. A execução fiscal portuguesa corusca a Roménia – país da legalização das bruxas pelos impostos – jurava Paula Teixeira da Cruz, vice-presidente do PSD: “não contem com o PSD para aumentar impostos em 2011” , o prometido é? duvido. Citações de loiras – Madonna: “sou forte, sou ambiciosa, e sei exactamente o que quero, se isso faz de mim uma cabra, ok”, têm arrostado a nação para o penisqueiro empadão rico, afinal, ninguém vendeu a mulher para comprar um Dacia [7]. Sarambeques, sarambas, caxambu, nos adros, ou nos shows de rádio, bailam os orgulhosos portugueses: “5 mil em lista de espera para comida e roupa”, segundo um estudo da universidade Católica e do Banco Alimentar, “restaurantes vão poder dar comida que sobra em vez de a deitarem ao lixo”, “portugueses estão a comer cada vez pior”, “preço do pão sobe 12%”, só “os tolos e os lunáticos” (didascália Manuel Pinho) veriam nestas proposições catástrofe, logo desmentidos por boas novas: “100 € de multa para quem não pagar as taxas moderadoras”. Povo que paga taxas, coimas, multas, gorjetas altas não terá trabalho infantil.
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[1] Cavaco Silva: “eu orgulho-me imenso de tudo o que fiz como primeiro-ministro. Vá lá ler os relatórios internacionais (…) eu orgulho-me imenso de tudo o que fiz como primeiro-ministro. Sou uma pessoa muito orgulhosa daquilo que fiz”.
[2] “Map of Tasmania” ۞ versão ao vivo ۞ site. Amanda Fucking Palmer: “acho que a intriga deliberada não é o meu forte. Vou deixar isso para a PJ Harvey”, pianista, vocalista, compositora do duo Dresden Dolls e uma metade do duo Evelyn Evelyn. Casada com o escritor Neil Gaiman. Amanda regressou à sua ex-escola, a Lexington High School, para a peça “With the Needle That Sings in Her Heart”, inspirada por “In the Aeroplane Over the Sea” dos Neutral Milk Hotel, e organizada com os alunos do departamento de teatro deste liceu. “Leeds United” ۞ “Oasis”: “história fictícia de uma fã dos Oasis e vítima de violação que faz um aborto” que todas as televisões inglesas recusaram transmitir.
[3] João Mira Gomes, embaixador de Portugal na NATO, abasbaca: “aliás, é curioso que o presidente Obama, na sua conferência de imprensa, referiu-se à forma como tinha corrido a Cimeira de Lisboa, dizendo que na próxima cimeira, que será nos Estados Unidos em 2012, agora será mais difícil para os Estados Unidos, por que a fasquia, nós colocamos a fasquia demasiadamente alta, e portanto ele tinha tomado notas, como se organizava uma cimeira, e que também devia perguntar como é que nós poderíamos dar conselhos para que a cimeira nos Estados Unidos seja tão boa como a nossa”.
[4] Nos anos 90, o ator bigodaças narrou publicidade, prenunciadora de futuro, para a AT&T.
[5] Ilustres endossantes: Mikhail Gorbachev participou numa campanha publicitária para as malas Louis Vuitton e James Dean, num anúncio de serviço público, subvenciona a segurança rodoviária com mensagens contra os jovens aceleras.
[6] Viagens penianas: “a maioria dos pénis pintados nas casas ou suspensos dos telhados no Butão são maiores que as pessoas”. No Japão, “é Primavera e isso significa uma coisa. Na verdade, duas coisas. Festivais de pénis e festivais de vaginas”: o Kanamara Matsuri (“festival do falo de aço”) e vaginas no santuário de Oogata Jinja.
[7] De tão ricos serem, os políticos portugueses deslocar-se-iam para o árduo trabalho em carros blindados, com estofos de pénis de baleia: o Prombron Monaco Red Diamond Edition, da Dartz, “o mais caro SUV do mundo”, “janelas banhadas a ouro puro, escapes de tungsténio, e conta-quilómetros incrustados de diamantes” e… estofos “eles são feitos de um dos materiais mais suaves existentes – couro de pénis de baleia”. A empresa reconsiderou: “estamos apenas à procura dos materiais mais caros para este carro – e, por isso, escolhemos o couro de pénis de baleia, quando verificamos ser o mais caro de todos”, vitória dos ambientalistas.
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Povo confiante nas suas pinups: na Áustria, no Festival de Salzburgo, dialoga uma locutora da RTP com um anónimo turista de filha a tiracolo. Turista: – “estou à espera das pessoas. Vim só ver as pessoas”; locutora: – “as celebridades?”; turista: – “talvez, um pouco”; locutora: – “e o presidente de Portugal? Está cá”; turista: – “está cá? Ouvi falar, mas não conheço a cara dele… ok lamento”; Final: Molto allegro, remata ela com apontamento cultural: “importa dizer que Mozart era pouco maior que esta menina quando compôs a sua primeira obra aqui em Salzburgo”.
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“Os teóricos (renascentistas) tentavam esquecer o campo visual esférico dos antigos (gregos / romanos), a sua perspectiva angular, que ligava a grandeza aparente, não à distância, mas ao ângulo segundo o qual nós víamos o objeto, o qual eles chamavam desdenhosamente a perspectiva naturalis ou communis, a favor de uma perspectiva artificialis capaz em princípio de fundar uma construção exacta, e eles iam, por acreditar nesse mito, até a expurgar Euclides, omitindo das suas traduções o teorema 8 [1] que os incomodava”, Merleau-Ponty em “L’Oeil et L’Esprit”, na sala de cinema o ângulo do espetador sujeita-se à hora, tardia ou não, da compra do bilhete. – “My Best Friend’s Birthday” (1987), primeiro filme de Quentin Tarantino. – Onze segredos escondidos no “Fight Club” (1999). – Armas nos filmes: a metralhadora protética M203 na perna de Cherry Darling (Rose McGowan) em “Planet Terror” (2007); o phaser na série de TV “Star Trek: The Next Generation” (1987-94). – Porno vintage: logótipos e posters; impressionantes exemplos de representação e “Batman XXX” (2010), a comparação. – Viajar no tempo: “teorias na série Star Trek”, no episódio “The City on the Edge of Forever” (1967) o Dr. McCoy, enlouquecido pela Cordrazine, “acidentalmente muda a História, para os nazis vencerem a Segunda Guerra Mundial, como consequência, no presente, a Enterprise já não existe”; o melhor filme viageiro: “La Jetée” (1962), fonte do vídeo “Dancerama” dos Sigue Sigue Sputnik; “regras para viajantes no tempo”: regra nº 1 “viajar para o futuro é fácil”; “A Guide To SF Chronophysics”: “o tempo é a dimensão que é assimétrica em relação à entropia”; navegações na literatura. – Cenas nuas: a canadiana romântica Rachel McAdams, “uma vez fiz uma – era suposto demorar 30 minutos – salada de feijão que me levou 6 horas”, em “The Notebook” (2004). – “The Intruder” (1962), do livro de Charles Beaumont, realizado por Roger Corman, com o canadiano William Shatner no papel de “Adam Cramer, um manhoso, demagogo, racista que viaja para o sul na sequência da decisão do Supremo Tribunal Brown vs Board of Education, fomentando protestos e motins e organizando grupos de cidadãos brancos, com ele na liderança”; “a equipa de filmagem foi corrida de East Prairie, Missouri, pelo chefe da polícia (alegadamente por serem comunistas)”; entrevista com Corman e Shatner.
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[1] “Quando uma linha reta cruza duas retas paralelas produz ângulos alternados iguais, e faz com que o ângulo externo seja igual ao ângulo interior oposto do mesmo lado”.
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[Sinos de igreja – propala-se pela tradição que foi S. Paulino de Nola (354-431 d. C), na Campânia, Itália, quem primeiro armou sinos na torre de uma igreja para congregar o rebanho cristão nas suas multíplices rezas. Mas, provavelmente, o reflexo ao som metálico, condicionando orações nos cristãos propagou-se – primeiro em chapas de metal, o semantron, depois na forma campanular – desde que o imperador Constantino I (272-337 d. C.), convertido ao Cristianismo, interditou pelo édito de Milão (313) as folgazonas perseguições dioclecianas no Império Romano. Este tocamento na posse de pregadores arrebenta-bilhas*: como o reverendo Larsh, aliás o perigoso extraterrestre Kritak, no filme “The Invasion of the Space Preachers” (1990), com o gás de Johnny Angel, o rockabilly boy, dos banhos nu ao sol com as groupies Dreama (Stacy Weddington) e Rhonda (Piper Thayer) – é um abre-latas do espírito, um saca-rolhas do corpo, nesta maré de anorexia nervosa do onzenário dinheiro é o bombo da bateria, o escape para a sanidade, escreve o Central Council of Church Bell Ringers: “tocar o sino é uma atividade de equipa que estimula o cérebro e ajuda a manter a forma”. Tlim-tlão! bimbalhemos como se os céus se abrissem: “Tubular Bells”! “Bang Go the Bells”! (dos Babylon A. D.).
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* Os padres integram-se na mesma caracterização de Belmiro de Azevedo para os políticos: “não têm nunca a intenção de esclarecer, sem procurar, catequizar as pessoas, para aceitar uma certa opinião. Deixemos de lado esses discursos folclóricos eleitorais, vamos fazer, trabalhar a sério”.
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Dar aos tintins é arte antiga: “Tintinnalogia, or, the Art of Ringing” (1713) e saldada com canecos de cevada maltada: Marjorie: “os tocadores eram pagos em cerveja e, embora, infelizmente, esse costume cessou, continua prática habitual dos tocadores escaparem-se para um bar nas redondezas, após uma tarde de toques”. Contemporaneamente, dá-se ao badalo, sob diversas formas de campanologia: carrilhões, mudança de toques, sinos ortodoxos russos… O tão-baladão no “Bells on Sunday”, da BBC Radio4, na catedral de Durham ۞ Southwark Cathedral Society of Bell Ringers.
Outro formato de repenique é o tlintlim de sinetas tocadas à mão “Not Your Average Bell Choir” ۞ “Westminster Concert Bell Choir” ۞ “Handbell Choir of First Baptist Church Eastman, GA” ۞ tocadas em luz negra ۞ Pirates of the Caribbean ۞ e os OK Go.
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Em Portugal, no século XVIII, o rei D. João V, opulentado com os quintos do Brasil, delapida 50 000 moedas de ouro no primeiro carrilhão, nos campanários nacionais, construído por Guilherme Withlockx na Antuérpia e Nicolau Levache em Liège, para as torres do Real Edifício do convento de Mafra. O carrilhão português mais famoso, pelo padreca hábito, depois da banalização do relógio de pulso, de ainda insistir em chagar a pinha dos próximos com toques de sinos* é o da Igreja dos Pastorinhos, em Alverca, fundido na Holanda pela Eijsbouts, por 500 000 euros, em 2005: Passacaglia da Suite n.7 de G. F. Handel. Ana Elias e Sara Elias foram as primeiras carrilhanistas residentes deste carrilhão; Ana “aos seis anos recusava-se a cantar as músicas próprias da idade, como a “Joana come a papa”, e adorava ouvir Chopin e Mozart. O que levou os pais a consultarem um médico que apenas ‘receitou’ aulas de música”, de mãos no carrilhão promete “tocar todos os tipos de música, uma vez que o público é muito vasto” e, para os jovens, juventalhices tipo Metallica.
Badalão badalão do duo das manas Elias, LVSITANVS “Metallica Ballads” ۞ fantasia "D. João V" por Ana Elias, dedicada a Sara Elias ۞ “Sonata in C Major” de Carlos Seixas ۞ “My Way”**.
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* O padre José Maria Cortes nega tanto como um Pedro: “o pároco garante, no entanto, que não estão a infringir a lei, até porque foram feitos estudos de impacte ambiental e de volume de decibéis que consideraram que o som do carrilhão não ofendia”.
** Ânglico “Comme D'Habitude”, composta em 1967 por Claude François e Jacques Revaux, letra de François e Gilles Thibaut. Paul Anka comprou os direitos para a sua versão inglesa pelo melhor preço: de borla. Canção depois vulgarizada pelo Shane MacGowan, pela Nina Hagen… ah! e pelo Frank Sinatra também].